segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Chorou, passa pra mãe! Ou não...

Sabe aquela frase célebre de tia? "Ter sobrinho é ótimo, porque você aproveita a parte boa e se chora é só devolver pra mãe!" Ultimamente tenho matutado sobre criação compartilhada (não sei se o termo existe, já já volto nele) e um episódio de hoje me fez repensar essa frase, essa coisa de "se chorar é só chamar a mãe".

Estamos aqui em casa lidando com gripes, febre e tosses há uma semana. Primeiro o pai, depois o filho e por último a mãe (que bom que a gente reveza!). Tive uma noite de sábado com pouco descanso, passei o domingo fracota, tive febre, coisa que há muito não acontecia, dormi mal de ontem pra hoje. O Joaquim ainda não está 100% e demanda com suas manhas.

Pois bem, fui deixá-lo na minha mãe, coisa que faço toda segunda à tarde. Fiquei lá um tempo, ele estava manhoso, esperei ele ficar bem e saí.

Passei no supermercado e quando estava vindo pra casa pra finalmente descansar um pouco, recebo uma mensagem da minha mãe, dizendo que o Joaquim estava chorando e que ela ia trazê-lo pra mim.

NÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃO!!!

Liguei pra ela e falei que eu precisava da ajuda dela, que eu estava cansada e que ela precisava dar conta do Joaquim. Em outros tempos eu diria "ok", pensando "o filho é meu, eu que preciso cuidar dele". Aí ele chegaria, eu estaria cansada, ficaria mais cansada, teria uma paciência nula e seria pior pra nós dois (e pro pai também, que chegaria em casa no meio de um caos). Isso já aconteceu algumas vezes...

Hoje precisei dessa gripona, com febre e tudo, pra entender que sim, o filho é meu, mas não, eu não tenho que cuidar dele sozinha, eu não sou a única responsável por ele!

Eu já ultrapassei limites pra não incomodar o pai, que estava trabalhando, coisa que não faço, logo, pensava eu, o mínimo que tenho que fazer é dar conta da casa e da criança! E isso me serviu pra entender que ultrapassar esse tipo de limite só serve pra rever nossos (pre)conceitos e resolver contratar uma empregada, ou coisas do tipo, ou seja, não é aquela sensação de superação "eu consigo!". É a sensação de "caramba, eu não consigo MESMO!".

Depois disso eu já pedi arrego pro pai, pra não incomodar a vó, afinal, o filho é nosso, a gente que cuida. Hoje eu poderia ter feito isso. Mas por um instante de lucidez, não fiz! (um dia espero poder aprender essas grandes lições sem precisar de gripe, febre, choro...).

E aí me volta uma frase da Laura Gutman que me intriga desde muito antes de ficar grávida: "uma mãe e um pai não são suficientes pra criar um filho".

Claro que não são! Vai precisar de vó, de vô, de tia, de madrinha, de amigo. Até de médico! E se não puder contar com essas "ajudas" vai ter que terceirizar: babá, creche, escola, televisão, tablet... (estamos em campo polêmico e é aqui mesmo que quero estar. Se isso te cutuca é pelo simples fato de que você acaba de constatar que uma mãe e um pai não são suficientes pra criar um filho! E com essa constatação você pode ter mais clareza da rede na qual vem se apoiando pra criar seu filho, ou melhor: da rede que você vem tecendo pra criar seu filho. Porque o papel de mãe e pai não é assumir TODA a responsabilidade pela criança, mas sim tecer uma rede que a ampare).

Então eu chego em casa e posso finalmente descansar. Mas me pego pensando "Será que o Joaquim ficou bem?", "Será que eu ligo pra saber como ele está?", "Se ele tivesse dormido minha mãe me avisaria... por que ainda não avisou?!", "Tadinho, como eu sou insensível! Eu deveria ir lá buscá-lo!".

Vi que não conseguiria descansar com isso tudo martelando e ao mesmo tempo não tinha forças pra ir lá buscá-lo. Resolvi escrever!

Essa coisa de confiar na minha capacidade de tecer uma rede pra amparar meu filho (e a mim, em última análise) foi me acalmando. A minha mãe é a pessoa no mundo (depois do pai, é claro), que mais confio pra cuidar do Joaquim. Por tudo que ela é e pela proximidade que temos, pela convivência, porque o Joaquim fica muito à vontade com ela. Então, com o que me preocupar?

Pode ser que o Joaquim sofra um pouco... só que antes agora do que mais tarde. E se sofrer agora é porque não fui capaz de passar essa confiança antes. Paciência. Precisei de alguns tropeços pra ter essa clareza, mas agora que ela chegou, o que quero é ensinar pro Joaquim que ele está seguro com quem eu - ou o pai - designar que ele esteja. E eu sei que logo ele vai ter discernimento pra escolher com quem ele se sente seguro, mas num primeiro momento tenho que dar uma forçada de barra, pra romper o "vício" (é uma palavra forte, mas tenho visto ultimamente que mãe vicia! Eu tenho sido super apegada com o Joaquim e isso certamente acabou gerando esse vício. Não me culpo por isso, na verdade ainda acho melhor assim do que o contrário, mas avaliando em retrospecto vejo que me faltou essa confiança na rede; e não só confiança, mas merecimento também; ou reconhecimento de que é necessário e natural e não "folga"; ou ainda, essa compreensão mais ampla do que são os papeis de mãe e pai).

E por falar em rede e pra não deixar em aberto o termo "criação compartilhada", nem sei se ele é necessário, porque toda criação é, de alguma forma, compartilhada. A questão é ter consciência de com quem compartilhamos. A questão é assumir esse papel de mãe ou pai enquanto aqueles que escolhem com quem compartilhar, sabendo que compartilhar ou não não é uma escolha!

Sei que às vezes parece que a gente não tem escolha. Você tem um emprego, precisa desse salário, fica grávida, tira licença. E quando acaba a licença?! Ou mesmo enquanto está de licença... quem cuida de um recém nascido sozinha?! Mesmo que o pai seja um cara bacaníssimo, os dois não dão conta. Não é pra dar... vocês já começaram a tecer essa rede de alguma forma...

Mas só pra não deixar em total desamparo quem se sente sem escolha, acho que o maior barato de ter filho é que eles viram a gente do avesso. Filho vem pra balançar tudo o que a gente acredita, filho vem pra nos mostrar que todo aquele nosso planejamento agora não serve mais, filho vem pra nos revelar novas habilidades que nem sabíamos que tínhamos. A única coisa que precisamos fazer é deixar, soltar. Não o filho, a nós mesmas. Quando a gente se deixa, se permite, se solta, se abre, as possibilidades se apresentam e então podemos escolher. Enquanto estivermos presas em nossas velhas e enrijecidas formas de pensar e agir, não existem possibilidades e sem possibilidades não existem escolhas.

(isso serve desde o parto, quando literalmente precisamos soltar e abrir. Na época eu não consegui. Estava presa em minhas certezas... e serve também pra amamentação, quando também precisamos soltar, deixar fluir, deixar jorrar! Essa eu consegui, e que alegria ter sido merecedora dessa paz! E é um aprendizado constante. É preciso estar atento e forte. Não dá pra dizer "agora eu sei". A grande sabedoria é saber que a gente nunca sabe!).


PS - enquanto eu escrevia minha mãe mandou uma mensagem dizendo que o Joaquim tinha dormido. Ufa!

PS2 - jamais insista em ficar com uma criança chorando sem que a mãe saiba, ou sem que isso tenha sido combinado! Por exemplo, você pode não comunicar a mãe que a criança está chorando se o acordo tiver sido "fique com ele mesmo que ele chore e se chorar não me avise!". E nesse caso, não julgue... apenas conheça seus próprios limites, porque ficar com uma criança chorando é dose! E se não tiver combinado nada, avise da seguinte forma: "Fulaninho está chorando, posso ficar mais com ele e fazer alguma coisa para acalmá-lo, tudo bem?". Ou se você não é capaz de lidar com criança chorando diga logo de cara, antes da mãe sair "Eu fico com ele, mas se ele chorar vou ter que te chamar!". Tudo fica tão mais fácil quando está claro... o que não significa que não possamos tatear no escuro... mas com a clareza de que está escuro!

PS3 - mães, confiem! Confiem no seu discernimento de escolher com quem deixar seus filhos. Tenha consciência, escolha e deixe. Faça os combinados necessários, e deixe. Nada disso impede que você volte atrás ou ligue pra saber como está... mas tome um chá antes... se passar, passou. E intuição de mãe é muito forte. Se for algo realmente necessário, você vai saber, antes mesmo do chá. Como saber se é intuição ou se é insegurança? Escolhendo com consciência. Sabendo que você pode escolher, saindo do lugar de vítima, assumindo suas escolhas.

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Quero fazer uma atualização! Fomos buscar o Joaquim e ele estava ótimo. Jantamos lá todos juntos e quando eu estava aqui em casa, na cama com ele agorinha esperando ele dormir tive uma sensação muito forte de que pra ele é muito importante saber que ele pode contar com as pessoas! Antes era assim: "putz, se eu não fico bem aqui, a única coisa que pode me salvar é minha mãe aparecer!". E agora ele pôde sentir "minha vó é capaz de me dar o que eu preciso, existe mais uma pessoa no mundo com quem eu posso contar". Gente, vocês tem noção da importância disso?!?! E nós, mães que achamos que temos que dar conta de tudo sozinhas, privamos nossos filhos de ter com quem contar. Cruzes!